quinta-feira, 19 de abril de 2012

Hatikva em Auschwitz

Hoje participamos da vigésima quinta edição da Marcha da Vida. Ao mesmo tempo, conhecemos o terrível campo de concentração e extermínio de Auschwitz e os horrores desta destruição sem paralelo na história.

Um mar de casacos coloridos preencheram o caminho que liga o campo de Auschwitz I, ao campo de Birkenau (Auschwitz II), onde foram exterminados mais de 1 milhão e meio de judeus. Jovens de todas as partes do mundo que vieram aqui para conhecer nossa história e colocar mais um tijolo na construção de nosso futuro. Uma cena linda, cheia de vida - desafiando a morte que até hoje paira sobre Auschwitz.

Viemos para testemunhar, para conhecer, para vivenciar, para refletir. Viemos para não permitir que se esqueça jamais.

É difícil descrever essa sensação ambígua de estar no campo da morte, celebrando os valores da vida. Podemos sintetizar assim: Hoje cantamos o Hatikva em Auschwitz. Quem diria há 65 anos que hoje teríamos uma pátria, um lar, um hino? Quem diria durante o pesadelo da shoá que hoje estaríamos aqui, colorindo a paisagem? Quem diria que seríamos livres? 

Hoje nós cantamos o Hatikva em Auschwitz.

Peço que leiam a carta abaixo, escrita por um sobrevivente de Auschwitz e endereçada ao seus antigo comandante no campo (e não deixe de assistir o vídeo no final):

Carta ao Inferno

Excelentíssimo senhor oficial da S.S.,
Ex-comandante do Campo de Extermínio Auschwitz:

Chegou finalmente o momento de você ouvir o que vou lhe dizer agora - eu, o ex-prisioneiro nº 17724 de Auschwitz.

Eu, que fui transportado, junto com minha família, como se fôssemos animais, num vagão de animais, apertados uns aos outros, durante dois dias e duas noites, até chegarmos ao seu campo  sem poder beber água ou sair para fazer as necessidades, nem mesmo uma vez, durante toda a viagem. Não tínhamos nem sequer lugar para sentar. Organizamos um rodízio, para que alguns de nós pudéssemos sentar um pouco de cada vez.

Eu, que fui arrastado violentamente do vagão. Quando chegamos àquele terrível lugar, fui separado de minha família  e jamais tornei a ver a maioria deles  despido completamente e conduzido a pancadas, junto com um rebanho de gente como eu, humilhada e encurvada, à seleção. Fui escolhido para, por enquanto, continuar a viver e a sofrer. Mas só por algum tempo  até que a última gota de minha vitalidade fosse aproveitada.

Eu, que fui vestido com um pijama listrado bem fino e dois pés esquerdos de tamancos de madeira, tatuado com um número e jogado, junto com os outros, na enorme prisão.

Eu, que fui humilhado de todas as maneiras possíveis, que passei fome além dos limites imagináveis, que comia uma papa feita de beterraba suja, dentro de um pinico retirado dos pertences roubados aos judeus, junto com outros nove prisioneiros; tínhamos que comer com as mãos, sem colher ou garfo, cada um por sua vez, e cada um olhava com olhos famintos para seu companheiro, vigiando quanto ele comia.

Eu, que fui açoitado quinze vezes com um grosso fio elétrico, quando tentei pegar umas cascas de batata da lata de lixo da cozinha dos S.S..

Eu, que trabalhei duro 16 horas por dia na mina de sal, em troca de 160 gramas de pão e meio litro de líquido por dia.

Saltei, corri e joguei-me ao chão segundo as exigências e a loucura do oficial de plantão que fazia de Selektzia entre a vida e a morte de vez em quando. O critério de vida era a distância do salto e a velocidade da corrida. E eu, apesar de tudo, continuei vivo e não morri, embora mais de uma vez tenha pensado em parar de lutar e pôr um fim a tudo aquilo.

E agora, aí vai um trecho publicado esta semana num jornal de Israel: “Os membros da delegação de 50 jovens do Movimento Kibutziano Unido depositaram um ramo de flores, empunhando a bandeira de Israel. No final da cerimônia, os jovens disseram Kadish e cantaram Hatikva.”

Sabe onde foi isso? Em Auschwitz!
Gostaria que você soubesse que uma das jovens da delegação é a minha neta,  a neta do prisioneiro de Auschwitz. Passaram-se desde então 42 anos, e durante todo este tempo eu não consegui dominar o terrível sentimento que me torturava: por que eu não me rebelei? Envergonhava-me diante de meus filhos, e quase não lhes contei o que se passou comigo naquele lugar, naquele outro planeta, porque deixei que me conduzissem como um rebanho ao matadouro.

E, veja só, justamente os meus netos (todos eles nascido em Israel, sabia?) me ajudaram a compreender. Na verdade, eu me rebelei, eu lutei contra vocês, porque vocês queriam que eu morresse ali, para que pudessem espalhar as minhas cinzas juntamente com as cinzas de tantos outros pelos campos de Auschwitz. Mas eu não me rendi diante de vocês. E agora há continuação e futuro. Minha neta passou pelos malditos portões de Auschwitz, uma jovem cheia de orgulho, membro da delegação israelense sob a Bandeira de Israel. E aí, no vale da morte, entoaram o Hino do Estado de Israel.

Pois bem, eu não fui conduzido como um rebanho ao matadouro  eu lutei, me rebelei e prossegui. Houve uma guerra entre nós e o vencedor fui eu. Minha neta é o símbolo de minha vitória.

Assinado: O avô de Saguit, da delegação israelense da Marcha da Vida
                Israel - O Estado Judeu





5 comentários:

  1. De arrepiar! Obrigada, Daniel. O blog nos permite vivenciar esta tamanha emoção ao lado dos nosso filhos e irmãos.

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  2. Realmente, Daniel, estar acompanhando vocês é vivenciar junto esta experiência ímpar que nossos filhos levarão para toda a vida. De todo o polígrafo entregue aos alunos da Marcha da Vida, o que mais me impressionou é esta carta ao inferno. É exatamente isso: vencemos, estamos aqui, judeus em todo o mundo, integrados em suas comunidades, Israel está forte. AM ISRAEL CHAI! Aproveitem muito essas vivências. Beijos do Geraldo, pai da Marina

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  3. Gabi,que bom que tu estas aí....que bom que vocês todos estão aí e nós acompanhando tudo, emocionados pela vivência que vocês estão tendo.Aproveitem todos os momentos.Te amo filha, bjs pra todos!

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  4. Agora que parei de chorar, consigo elaborar alguma coisa que queria muito, mas não conseguia expressar.
    Agradeço por meu filho estar junto a vocês, não apenas por se tornar mais membro(e portador da história) de um povo, mas pela oportunidade de tornar-se um homem justo e solidário com toda a humanidade.
    Deus os abençoem pela coragem de compartilhar a história, a dor e a alegria.
    Mais e sempre beijos a todos.

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    1. Faço de suas palavras as minhas, chorei, chorei e agora crio coragem para que dizer os relatos e a carta ao inferno me fizeram refletir de como é bom saber que meu filho e todos os outros vão voltar mais justos com o mundo. Sem palavras para continuar....
      Filho sei como está sentindo tudo isso, mas lembre-se que TE AMO DEMAISSSSSSS.

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